quinta-feira, 13 de agosto de 2015

breve reflexão sobre uma passagem martiniana de Carlos Malheiro Dias

Entre a doce inconsciência de peraltas e sécias da guerra que lá vem e comezainas da criadagem (com a expressiva personagem do cocheiro Xavier (ou Mestre) Estoqueta), prefiro dar atenção a um eco de Oliveira Martins na prosa de Carlos Malheiro Dias: 

«E o nobre Ataíde, com essa familiaridade com que sempre os fidalgos portugueses se aconchegaram ao povo, agradecia aos bolieiros e eguariços, erguendo da cabeça o chapéu de bico largo.»

Esta pretensa comunhão entre nobreza e povo, passando por cima da burguesia, foi tema muito explorado por Oliveira Martins e outros no seu encalço. A verdade é que este wishful thinking, como agora se diz, prende-se, sociologicamente, com o triunfo da burguesia (argentária, sem princípio nem passado) e correspondente decadência da aristocracia, que em muitos casos se tentou consorciar com os arrivistas. Fazer disso uma base para uma teoria política que desembocaria no cesarismo, como o fez Oliveira Martins, é uma fantasia sem ponta de plausibilidade.

Carlos Malheiro Dias, Paixão de Maria do Céu (1902), cap. II

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