sexta-feira, 28 de novembro de 2014

leituras de 2014 - #54 NENHUM OLHAR

Um romance sobre a vivência trágica da vida, escuro por vezes obscuro.
Trata-se do primeiro romance de Peixoto (de 2000), e podemos detectar algumas influências, uma reais outras talvez sugestão minha. Quanto às reais, é inegável que o estilo de José Saramago aqui se faz muito sentir; subjectivamente, ouvi os ecos de algum José Régio, das narrativas alentejanas, e Manuel da Fonseca, alguns contos seus.   4****

ficha
Autor: José Luís Peixoto
título: Nenhum Olhar
colecção: «Língua Comum»
editora: Quetzal
local: Lisboa
ano: 2014
impressão: Bloco Gráfico, Maia
págs.: 221


quarta-feira, 26 de novembro de 2014

4 ou 5 págs.: EUCLIDES E HERCULANO

Este texto foi publicado no número espécime (ou número zero, como se diria hoje) de O Diabo -- Semanário de Crítica Literária e Artística, de 2 de Junho de 1934. Ferreira de Castro dá conta do grande momento que então vivia a literatura brasileira, não apenas no romance como no ensaio. Ele não menciona, mas como sabemos dos seus contactos estreitos com o meio cultural do Brasil, é evidente que estaria a pensar em nomes como José Américo de Almeida, Graciliano Ramos, José Lins do Rego, Erico Veríssimo, Rachel de Queiroz, Gilberto Freyre e, especialmente, em Jorge Amado, com quem se coemaçava a corresponde e de quem viria a ser grande amigo.
Essa referência serviu de introdução ao desconhecimento por que passava a literatura coeva, ao contrário do que sucedera com a do século XIX -- em que enumera alguns dos grandes nomes desse tempo, acrescentando, no início da centúria seguinte, o de Euclides da Cunha, cujo reconhecimento por cá se restringia aos meios literatos, não alcançando ainda o público leitor em geral.
E, curiosamente, vai compará-lo a Alexandre Herculano, não apenas na propensão para a História mas também por uma propensão austera de ambos, distiguindo-se, porém, no colorido da prosa: brônzea no autor da História de Portugal, polícroma no d'Os Sertões, diferenças entre o luso e o trópico.

Início: «Há alguns anos, os escritores brasileiros queixavam-se, e, possivelmente, ainda hoje se queixam, de serem pouco conhecidos em Portugal, enquanto os portugueses estavam largamente difundidos no Brasil.»

um parágrafo: «Irmanados pelo mesmo arcabouço literário, pela mesma forte orquestração verbal, os dois separam-se quando as pupilas devem constituir elemento a aproveitar. Herculano tem pouca cor, usa poucas cores. A sua visão não encontra cromatismos e é como o seu pensamento: profundo, vasto, mas sóbrio. Se tivesse de pintar, seria como certos mestres da arte espanhola; sombrios, procurando exteriorizar-se pelo castanho e pelo negro. Há sempre algo de arte ibérica, conventual, neste génio português.» 

Ferreira de Castro, «Euclides e Herculano», O Diabo, número espécime, Lisboa, 2 de Junho de 1934; antologiado por mim em «A unidade fragmentada. Dispersos de Ferreira de Castro», Vária Escrita #3, Sintra, 1996.

quarta-feira, 19 de novembro de 2014

4 ou 5 págs.: A VINGANÇA DE D. PEDRO

A entrega a D. Pedro I e imediata execução de dois dos três assassinos de Inês de Castro, que se haviam homiziado em Castela: Álvaro Gonçalves, e Pêro Coelho (Diogo Lopes Pacheco atravessara os Pirenéus...).
A intemperança do rei, os espasmos de fúria, a gaguez que se exacerba com a ira, as réplicas de desespero e raiva dos que serão supliciados, são passagens vívidas que ilustram este episódio em que não se sabe onde começa a lenda.

Início: «Nos paços reais de Santarém, D. Pedro esperava, impaciente, a chegada dos fidalgos criminosos.»

um parágrafo: «Levantara-se. Tinha a boca e as barbas a pingar sangue na opa de veludo, e as mãos encarnadas como as de um carniceiro. Assomou a uma varanda dos paços, chamou pelos soldados, e, arremessando desprezìvelmente à praça essas sanguinolentas postas de carne, ordenou enfastiado à escolta:»

Antero de Figueiredo, «A vingança de D. Pedro», 14 Novelas Históricas Portuguesas, Lisboa, Estúdios Cor, 1965, pp. 147-154.

segunda-feira, 17 de novembro de 2014

4 ou 5 págs.: s/ título

 Auster continua a desfiar episódios e histórias insólitas que lhe aconteceram ou contaram. Agora é o episódio rocambolesco de um tio de um amigo, resistente nacionalista sérvio, cercado pelos alemães nos dias que antecederam o fim da II Guerra Mundial. Baleado pelos nazis na tentativa de fuga, quando os companheiros anteriores haviam sido abatidos, foi recolhido, inanimado, por um camponês. Transportado numa carroça conduzida por este, instantes após recuperar os sentidos, viu saltar a cabeça do homem que o conduzia, decapitada por uma carga de obus, sendo, logo em seguida, apanhado pelas tropas soviéticas, desmaiando novamente. Acorda numa enfermaria improvisada num barracão, e fica a saber que está prestes a ser-lhe amputada a perna ferida. Enquanto suplica que não lha cortem, novo bombardeamento faz com que volte a desfalecer. Mais tarde acordará com a perna intacta, tendo diante de si uma bela enfermeira por quem se apaixona. Não era o paraíso, mas parecia. O tio do amigo de Auster -- um chetnik que escapou duas vezes à morte no mesmo dia, milagrosamente, e que não acabará os dias com a bela enfermeira -- era, à data em que a história lhe foi contada, um prosaico angariador de seguros de Chicago.

início: «Pouco tempo depois do meu regresso a Nova Iorque (Julho de 1974), um amigo contou-me a história seguinte.»

um parágrafo: «Olhou pela janela o primeiro homem a correr pelo campo coberto de neve. Houve uma barreira de tiros de metralhadora vindos da floresta e ele foi abatido. Um momento depois, o segundo homem saiu, e passou-se a mesma coisa: as metralhadoras soaram e ele caiu morto na neve.»

Paul Auster, O Caderno Vermelho, trad. Fátima Freire de Andrade, 8.ª ed., Porto Edições Asa, 2002, pp. 7-14. 

quarta-feira, 12 de novembro de 2014

livros que me apetecem

Como Falsa Porta, de José Emílio-Nelson (Edições Sem Nome)
O Fado da Tua Voz. Amália e os Poetas, de Vítor Pavão dos Santos (Bertrand)
Um Lugar Só para Sí, de Ricardo Marques (Debout sur l'Oeuf)
Hawk, de André Oliveira, Osvaldo Medina e Inês Falcão Ferreira (Kingpin Books)
O Osso da Borboleta, de Rui Cardoso Martins (Tinta-da-China)
Prefácios, de Mário Dionísio (Casa da Achada)