domingo, 28 de fevereiro de 2016

caracteres móveis: três círculos com a luz do gasómetro

«Cansado da mesquinhez das terras arrendadas, o pai trabalhava agora na mina de volfrâmio dos ingleses como carpinteiro-escorador. Só vinha a casa ao sábado, e sempre à frente duma grande fila de mineiros. ("Não que ele eram duas léguas, tudo por caminhos ruins!" -- já tinha dito a mãe.) Mal apontava do outro lado da povoação, riscava no ar três círculos com a luz do gasómetro, que significavam:
"Ei!, cá vou: ponde a ceia na mesa!"» José Marmelo e Silva, Adolescente Agrilhoado (1948)

sexta-feira, 26 de fevereiro de 2016

caracteres móveis

«Admitindo que a verdade seja mulher, não será justificado suspeitar que todos os filósofos, conquanto dogmáticos, pouco percebiam de mulheres? Que o sério trágico, a imoportuna falta de tacto que até agora têm empregado para atingir a verdade, eram meios demasiado desastrados e inconvenientes para conquistar o coração de uma mulher? Certo é que ela não se deixou conquistar; e toda a espécie de dogmática toma hoje uma atitude triste e desencorajada, se é que ainda toma alguma atitude. É que há trocistas que pretendem que toda a dogmática caiu por terra -- pior ainda, que agoniza.» Friedrich Nietzche, Para Além do Bem e do Mal (1886), do «Prefácio», trad. Hermann Pflüger.

terça-feira, 23 de fevereiro de 2016

um caminho de luz

«Mas a lâmpada de bolso, de alguém ainda sentado numa das popas, estoqueou de repente a obscuridade, abrindo um caminho de luz, estreito e oscilante, na terra que trepava do rio para a floresta, gretada na parte alta, que mal se via.»

Ferreira de Castro, O Instinto Supremo (1968)

sexta-feira, 19 de fevereiro de 2016

livros que me apetecem




Fontismo -- Liberalismo numa Sociedade Iliberal, de David Justino (D. Quixote)
Não Há Tantos Homens Ricos como Mulheres Bonitas que os Mereçam, de Helena Vasconcelos (Quetzal)
Rio do Esquecimento, de Isabel Rio Novo (D. Quixote)

terça-feira, 16 de fevereiro de 2016

microleituras

O amor das ilhas e o amor de algo e de alguém, nas ilhas.

ficha:
Autor: Cristóvão de Aguiar
título: Sonetos de Amor Ilhéu
edição: do autor
local: Coimbra
ano: 1992
impressão: Ediliber, Coimbra
págs.:22
tiragem: 250

[tinha-me esquecido de] 1 verso:

NA ESQUINA DO VENTO

minha casa plantaste na esquina do vento
onde as marés afinam suas melodias
desde então te respiro e ganho meu sustento
caiando de palavras os muros dos dias

entre o meu e o teu corpo um intervalo lento
que a baixa-mar escolta bem de penedias
redobra o meu querer-te quanto mais te invento
e só depois me vejo de órbitas vazias.

velha pecha esta minha de mergulhar
nos confins do teu nome para te procurar
e a mim também por rumos que eu já nem sabia.

à minha conta trouxe o mar dentro em mim
vazei-o no meu búzio no dia em que vim
-- ouço o marulhar não lhe cheiro a maresia.



domingo, 14 de fevereiro de 2016

microleituras


José Emílio-Nelson traz para a poesia o cotão & outras sujidades que as boas almas de uso varrem para debaixo do tapete.

ficha:
Autor: José Emílio-Nelson
título: O Anjo Relicário
colecção: «The Impossible Papers»
editora: Black Sun Editores
local: Lisboa
ano: 1999
capa: foto de Jack Pierson, «Big Angel Youth»
impressão: Graficar, Carvalhos
págs.: 38
tiragem: 350

1 poema

À porta do meu Banco no patamar, acocorados,
um e uma, vendem a pele
de uns pratos encardidos
mesmo no traço que já lhes deu flores garridas.
Eles escorriam chuva, que chovia, para a louça.
Eles nem devem ter sangue pela tez lustrosa
da porcelana dos seus olhos de caveira.
(Até faz rir, leitor, coisa tão triste.)

quinta-feira, 4 de fevereiro de 2016

livros que me apetecem









Crónica do Conde Dom Pedro de Menezes, de Gomes Eanes de Zurara (IN-CM)
Diário Íntimo de Carlos da Maia, de A. Campos Matos (Colibri)
Largo da Mutamba, de Domingos Lobo (Vega)
Os Navios da Noite, de João de Melo (Dom Quixote)
O que Fazem Mulheres, de Camilo Castelo Branco (Guerra & Paz)
A Sala Magenta, de Mário de Carvalho (Porto Editora)
A Tomada de Madrid, de Mário Silva Carvalho (Saída de Emergência)