quarta-feira, 18 de novembro de 2015

12x25


«

Infância

Pouco me recordo de meu pai. Ficamos muito crianças eu e minha irmã, ela com três, eu com cinco anos, quando ele morreu. Lembro-me apenas que minha mãe soluçava, os cabelos caídos sobre o rosto pálido, e que meu tio, vestido de preto, abraçava os presentes com uma cara hipócrita de tristeza. Chovia muito. E os homens que seguravam o caixão andavam depressa, sem atender aos soluços de mamãe, que não queria que levassem o seu marido.
Papai, quando vinha da fábrica, me fazia sentar sobre os seus joelhos e me ensinava o abc com a sua bela voz. Era delicado e incapaz, como diziam, de fazer mal a uma formiga. Brincava com mamãe como se ainda fossem namorados. Mamãe, muito alta e muito pálida, as mãos muito finas e muito longas, era de uma beleza esquisita, quase uma figura de romance. Nervosa, às»

Jorge Amado, Cacau (1933), Lisboa, Planeta de Agostini, 1999, p. 25, ls.1-12

Sem comentários:

Enviar um comentário